Dia Mundial do Livro: Ah! pobre da literatura!



A data é importante, generosa porque na expressão "livro" cabe muita coisa para além da ficção, da literatura. Ah! pobre literatura num país como o nosso. Nessa data tão relevante é preciso pensarmos nela, na literatura. Literatura que para Antônio Candido é um direito inalienável como qualquer dos demais direitos da humanidade, literatura que em ser ficção, como lembra-nos Alfredo Bosi, nos descerra a mais duras verdades. Ah, como sofre nossa literatura!

Se é das coisas de que me orgulho é o fato de na minha humilde residência haverem livros em mais valor do que o carro que não possuo. Não os comprei todos é verdade, mas vieram de muito trabalho, e como agradeço-os por nestes tempos sombrios eles me auxiliarem com bons conselhos. Mas, ah! pobre literatura num país em que os livros são supérfluos e caros, mas um engradado de cerveja não.

A vida dos livros, da literatura, não é fácil não, de modo algum. Nem mesmo em ambientes em que eles reinam, como nas universidades. Nos cursos de letras. Mas, ah! Para minha surpresa, depois que iniciei meu curso de letras em 2014, descobri que boa parte dos colegas, e também alguns professores, não eram muito amigos da literatura. Pobre literatura, pobre de nós, um país cuja parte da população diz e acha que ler ficção é frescura.

E não falo aqui de pobreza e de dificuldade de acesso aos livros. Ah! pobre literatura num país que nem mesmo sua elite burguesa é íntima dos livros. Fingem-se europeus, mas afastam-se destes naquilo em que a Europa tem como característica presente: estantes e livros. Nestas terras onde têm palmeiras e sabiás, as mansões, as boas casas, raramente possuem livros, e pior, em muitos casos os possuem como elemento de decoração.

Ah! pobre da literatura com uma classe média que em grande maioria têm como "investimento" cultural ingressos para blockbusters enlatados e passam léguas de uma boa literatura.

Mas pensando bem, talvez sorte da literatura. Com tantas mentes tacanhas, retrógradas e cegas, se nossa burguesia fingisse ler mais, provavelmente apenas aumentariam as propostas de censura e fogueiras, pois nossa gente tão imoral, está sempre preocupada e atenta com "a moral e os bons costumes". Talvez não estejam prontas para o incômodo, para o soco na boca do estômago que toda boa literatura representa.

Na verdade, no fim, pobre de nós, sociedade, que sofre um bocado por causa dessa ojeriza tupiniquim aos livros (cerca de 30% dos brasileiros leem ficção). Esse afastamento, essa distância, infelizmente é co-responsável nesse verdadeiro "festival vergonha alheia" que tanto nos espanta, coisas do tipo "nazismo é de esquerda" e daí por diante. Esse afastamento nacional entre pessoas e literatura, ao cabo, ajuda a solidificar as intolerâncias, as ignorâncias que produzem ironias do tipo "se os dinossauros fossem brasileiros, torceriam para os cometas". Então, numa data de hoje, mais do que celebrar os livros, precisamos é compartilhar a consciência de que a literatura é indispensável para a humanidade, pois torna-nos mais humanos, nas acepções positivas desta palavra.