A Década do Grito



Tenho para mim que se fossemos definir os anos que vivemos, com certeza seria "a década do grito", algo que talvez explique esse andar para trás da humanidade que no mundo todo abraça as ideias conservadoras e põe em risco as conquistas progressistas e humanas dos tempos recentes. Contudo, não se trata aqui dessa questão política maias abrangente, mas sim observar que até mesmo nas coisas mais banais do dia a dia, parece-me o grito, uma virtuose, não somente dedicado à violência ao fim da capacidade de argumentação, já que isso já é algo bem antigo.

Então o que me preocupa é que o grito já não acontece mais na ruptura após longos debates (e não que isso seja mais tolerável), o grito nos cerca por todos os lados, e àqueles que não fazem uso deste "recurso" desaparecem, não existem. É com o se todos precisassem gritar para se autoafirmar, dominar, concentrar poderes, ter sucesso. Um exagero?

Talvez, mas olhe bem ao redor. Na televisão aberta ou fechada templos e mais templos controlados por gritões, shows muitas vezes ensurdecedores e ininteligíveis, mas que ainda assim seguram a platéia. Mas antes que me chamem de preconceituoso, o grito não é monopólio dos templos. Certamente vocês conhecem um ou outro Youtuber famoso, e se olharem de perto, a maioria não dialoga, gritam. Além disso, encontraremos gritões nos podcasts, no rádio, na televisão, e boa parte deles, com público cativo. Recentemente um exemplo do poder do grito aconteceu no questionável reality show Big Brother Brasil quando o gritou venceu a educação e a convivência social. Fez sucesso a gritaria, e pior que isso, o grito nesse caso foi efetivado ao passo que pessoas que esperávamos no mínimo criticidade e compreensão da complexidade dos símbolos, os jornalistas passaram a reproduzir e reler o bordão assumido pelas massas com se fosse uma grande coisa e efetivando uma prática, nó mínimo discutível. Se enveredarmos para política, bem, aí já não vale, pois este tem sido um campo de muitos gritos.

Pode ser que eu até esteja enganado, e os leitores deste post observem e digam, "nada a ver o que disse o cara", entretanto, desconfio que poderão também lembrar de um ou outros gritões que conhecem. De alguma forma invertemos do dito popular, o silêncio deixou de ser ouro, e hoje gritar ou escrever em caps lock é que se tornou o padrão. Será?