Uma fábula




Uma vez saíram para uma aventura o Valente, o Esperto, o Capitalista, o Impaciente, o Medroso e o Sábio. Percorreram mares, desertos, campos até chegarem a uma vasta savana. Quando por lá repousavam para seguir viagem, de repente viram-se cercados por gigantescos e famintos leões. Um grupo numeroso, mesmo. Rugiam entredentes enquanto salivavam ao fechar o cerco. Aos aventureiros, na iminência do ataque restou correr em direção da única grande árvore que havia por ali. Subiram às pressas, enquanto o bando de leões saltava com suas garras tentando pegar um ou outro. Na árvore, cada um se ajeitou como pode em algum galho. Lá embaixo os leões mantinham o cerco e ronda. Passados quinze minutos que lá estavam, Valente foi o primeiro a indignar-se com a situação. "Eu é que não bancarei o covarde me escondendo nesta toca, temos de enfrentar o perigo como homens" bradou, quem sabe em busca de aprovação à sua valentia. Ninguém mais se moveu. O sábio apenas disse, "olhe lá, meu rapaz". Mas valente pegou uma vara num dos galhos mais finos da velha árvore e desceu, pronto e disposto a enfrentar as feras em nome de sua liberdade. Mal dera um pequeno lambaço com a vara num leão, outro saltou sobre ele num golpe fulminante. Vendo a cena desesperadora lá do alto, Medroso num ataque de pânico começou a gritar em desespero, "vamos morrer, vamos todos morrer, vamos morrer!". No desespero desequilibrou-se, caindo no chão, fazendo companhia ao pobre Valente que àquela altura estava aos pedaços. O frenesi da tragédia durou algumas horas até que todos se recompusessem. Mas os leões, insaciáveis, permaneciam lá, à espera dos outros. Mas estes diante à macabra cena, se esforçaram um pouco mais, e permaneciam na árvore, alimentando-se de seus frutos e bebendo da água da chuva. Tinha-se então passado alguns dias quando o impaciente perdeu o que nunca teve. "Esta situação é insuportável, não posso mais ficar aqui". Tentou fugir encoberto pela névoa da madrugada, mas como leões estão sempre atentos, dera poucos passos até ser engolido por meia dúzia deles. Quando amanheceu, os que permaneciam na árvore se perguntavam onde estava o colega. Passaram-se mais alguns dias quando o Esperto, enfim resolveu agir. Catou folhas aqui e ali, lascou seiva, pintou-se, ornou uma juba fajuta e desceu da árvore certo que poderia disfarçar-se de leão e sair dali de pinotes. O problema é que ele não fedia como leões, não rugia como leões... nem de miado dava pra chamar aquela tentativa esganiçada. Pronto, os leões saltaram sobre ele; uns até se engasgaram com as folhas, ainda assim o Esperto também se deu mal. Por algum tempo restaram na árvore o Capitalista e o Sábio. Mal se falavam. Mas um dia, terminada sua disposição, o Capitalista preparou-se para o retorno às atividades "bem, deu minha hora. Meus investimentos chamam por mim, e a economia não pode parar, colega" disse ao Sábio. "Aliás, se quiseres, antecipo seu passe de liberdade" estendeu ao outro uma nota promissória com números de muitos dígitos. "Não, obrigado" disse o Sábio, lacônico. "Well, good lucky, my friend" disse o Capitalista, descendo orgulhosamente da árvore, em mãos sua mala recheada de grana e no coração muito empreendedorismo. "Senhores, senhores, se aproximem, lhes tenho uma proposta irrecusável" chamava aos leões. Entretanto, para horror do Capitalistas aquelas feras não sabiam o que era dinheiro; e também comeram o Capitalista. O Sábio permaneceu no alto da árvore. Os leões mantinham o cerco. Restava um. Nesse embate, verdadeiro jogo de nervos, duelo como nunca visto, mais alguns meses se passaram. Até que em certo entardecer ribombou por toda a savana trovoadas que pareciam os anúncios do apocalipse. Na árvore o Sábio catou uns cipós e amarrou-se bem firme. O estouro de uma manada de elefantes não vinha deixando nada pela frente. Quando o perigo alcançou a árvore sitiada, os leões se puseram em disparada como gatinhos assustados por vira-latas. A árvore vergou, mas não caiu, aos encontrões de cada elefante. O Sábio, seguro pelos cipós, no galho que estava, ficou. Pouco mais de hora após o estrondo, certo silêncio pairou na savana. Era o tempo dos insetos e dos bichos menores. O Sábio esperou um cadinho mais, e convicto que não havia mais sinal dos leões, retomou então sua jornada.