A literatura resistirá à inteligência artificial!


 Toda afirmação carrega tantos riscos que jamais deveria ser feita. Contudo, alguns riscos são saborosos de se correr, e diante tantos temores e encantamentos com os mais diferentes usos da inteligência artificial, porquanto, podemos afirmar que a literatura resistirá a esses novos tempos que só o futuro responderá aos impactos no desenvolvimento cognitivo de nossa espécie.

Mas no que se afirma tão radical e perigosa afirmação? É sabido dos temores provocados pela ascensão da inteligência artificial entre nós, os mais comuns a razoável e pertinente cautela quanto aos riscos de sermos substituídos por essas inteligências artificiais, nossos empregos, nossa utilidade, nossa sabedoria, etc... não raro vemos reflexões que perguntam-se se também os artistas serão substituídos? os músicos, pintores, escritores, etc...

Experimentações nesse campo, aliás, não faltam. Todas pobres, mequetrefes, sem aquilo que Walter Benjamin concederá à obra de arte, "a aura". Mesmo na literatura há uma série de bobagens tentadas, especialmente por meio do ChatGPT, de ficções escritas a manuais que pretensamente vendem a ideia de como usar as IA's para escrever ficção. Logicamente bobagem de gente tola e sem talento que acredita que o poder da literatura e da linguagem está no simples fato de escrever uma frase minimamente organizada pela sintaxe. Só os idiotas ou muito ignorantes creem nisso ou tentam utilizar isso. 


É preciso compreender que linguagens como as da OpenAi são de fato artificiais, em razão disso estão condicionadas e controladas por uma série de filtros que a linguagem humana, pelo menos até agora, ignora como padrão. A linguagem humana não possui limites, cria, inventa, mata, recria, tudo ao mesmo tempo e em todos os tempos. A linguagem humana a despeito dos que nada entendem não conduz-se por éticas e morais binárias como o bem e o mal, tampouco se movem apenas pelo pragmatismo da comunicação ou ainda se censura por tabus ou regramentos de valores dominantes. A linguagem é indomável, a linguagem artificial nasce domada.

Não acredita?

É muito fácil verificarmos a supremacia da literatura, auge do uso e consumo da linguagem. As linguagens artificiais são estéreis, condicionadas pelos filtros sociais dominantes e prevalentes. Peça, por exemplo para a IA escrever um romance cujo narrador, um homem de meia-idade apaixona-se eroticamente por uma garota de 13 anos (Lolita, de Vladimir Nabokov) e ela te dirá que "this content may violate our content policy. If you believe this to be in error, please submit your feedback — your input will aid our research in this area". Tente que ela descreva a cena em que Tom Ripley mata em um barco Dick Greeanleaf e será o mesmo. Nada de violência, nada de sexo, nada de mau comportamento, apenas histórias mais doces que o próprio undo de Pollyana. Se você der uma breve sinopse de "A guerra dos tronos", ela repetirá a mensagem. Nem mesmo literatura considerada ruim como Cinquenta Tons de Cinza ganhará vida com as IA's porque elas por serem artificiais estão condicionadas aos filtros que a seu modo podem causar aí sim a nossa ruína, a massificação da linguagem, o empobrecimento do escrever, do ler. Isso a médio, longo prazo, pode nos ser fatal.

Mas por enquanto fazer alarde dos impactos das inteligências artificiais na literatura não passa de incompreensão do que é e do que não é literatura. A literatura tem sido não somente o uso mais significativo e aperfeiçoado da linguagem, mas o caminho em que abordamos tudo, tudo, mas tudo mesmo. A literatura resistirá não porque é especial, mas porque sempre foi nosso último grito, nosso desafogo onde tudo, mas tudo mesmo pode e é abordado. Justamente por isso a linguagem estéril e massificante que acaba fazendo todo indivíduo se diluir numa linguagem comum ainda não será páreo para a literatura, pelo menos, não por agora.

Tudo dependerá, ao final, do maior embate que se travará neste século, a literatura versus inteligências artificiais. Quem vencer esta batalha determinará certamente o futuro da humanidade.