O homem sem ideologia é um mentiroso. Ou uma anta.




A principal preocupação do atual governo, pelo menos aquelas levadas a sério por eles é a ideologia. Certamente, vindo de ministros ou do próprio presidente você já ouviu algo semelhante "vamos tirar a ideologia disso daí". Claro que teríamos de discutir os por quês de um discurso tão vazio quanto este ser visto com alguma autoridade, é coisa que só floresce em ambientes de educação precária e pouca cultura. Mas acontece aqui, e creio que não se discutiu muito sobre as causas. Também não irei me estender, mas ainda rabiscarei mais sobre isso. Nestas palavras rápidas, contudo, sobre esta questão, gostaria de reforçar duas verdades apenas: o homem sem ideologia é um mentiroso. Ou uma anta.

Veja bem o caso do Brasil, embora nossas forças políticas que agora comandam o poder procurem discursar contra as ideologias, o fazem tão somente num duro e combativo processo de substituição de ideologias. Nisso mentem que vão tirar a ideologia daqui e dali, pelo contrário, apenas travam uma guerra de pensamentos filosóficos. Penso que há mais honestidade naqueles que assumem sua ideologia, e por isso admiro tanto Paulo Freire, enquanto uns o odeiam. Literalmente.

Aliás, a educação, o livre pensar, e a pluralidade de concepções teóricas e filosóficas é que tem sofrido o mais intenso ataque. Defenestra-se uma ideologia libertadora com intenções de impor-nos uma ideologia ainda mais alienantes do que os processos de fragilidade que nos permitiram chegar a este triste ponto de regressões civilizatórias, a tal ponto que tolerância virou palavrão, a evolução uma mentira e o terraplanismo uma certeza. Isto pelo menos entre aqueles homens e mulheres que dizem querer terminar com a ideologia.

Que ideologia maluca esta que quer acabar com a ideologia.

A verdade é que todo ser humano é ideológico. A não ser que sofra de alguma enfermidade ou patologia que o impeça de pensar. Cada indivíduo carrega junto de si sua ideologia, e isso não quer dizer que sejam elas boas ou más, às vezes ambas. A vida não se traduz desta dicotômica. Enfim, todos carregam alguma ideologia, e isso não quer dizer que seja bom ou mal, apenas o é. Toda vez que nos indignamos com alguma injustiça, estamos sendo ideológicos. Se concordamos ou minoramos esta ideologia, estamos ainda sendo ideológicos. Por exemplo, quando do assassinato da vereadora Marielle e seu motorista Anderson, todos compartilhadores de memes estavam sendo ideológicos, indiferentemente se o meme era de indignação ou se era daqueles que procuraram desqualificar a assassinada. Todos eram ideologia.

Se o governo anterior manteve uma conduta amiguinha demais da ditadura venezuelana, era pois ideologia, como trata-se de ideologia a recente aproximação do Brasil com Israel, e algumas outros governos até mais perigosos quanto o de Orban. No poder haverá então, muita, mas muita ideologia, e aquele que disser que não, estará mentindo.

Isto dito, cabe a cada um de nós procurar compreender nossa ideologia. Mas acima de tudo desconfiar daqueles que dizem governar sem ideologia. Minha ideologia permite desconfiar e muito deste tipo, dos que negam, ainda que não seja a palavra exata, dos que mentam agir sem ideologia. Estes são os mentirosos.

O outro tipo de gente sem ideologia são os antas. Esses, alguns conscientes, outros não, talvez dediquem-se à ideologia da alienação, do fingir que não existe tudo aquilo que interfere na sua rotina diária, pois que nada de maior alcance que as ideologias ideologias e o poder sobre nós. E quando estas duas coisas reunidas possuem asco dos mais pobres era hora então de grandes preocupações.